
BI
Cirurgião Ortopédico. Fundador e coordenador do Grupo de Infeção Osteoarticular do Porto (GRIP) desde 2017, no Hospital Santo António e no Hospital Lusíadas
Formação: Licenciado em Medicina pelo ICBAS (Universidade do Porto) em 2003. Realizou o Internato de especialidade no Serviço de Ortopedia do Hospital de Santo António entre 2005-2011 onde ainda trabalha como Assistente Hospitalar Graduado. Em 2017 terminou o seu doutoramento em Ciências Médicas no ICBAS - Universidade do Porto com a tese “Profilaxia, Diagnóstico e Tratamento de Infeções Periprotésicas”.
Resumo: Cirurgião ortopédico especializado em lesões do joelho com especial enfoque na substituição e cirurgia de revisão de prótese e infeções osteoarticulares. Ao longo dos anos, tem contribuído de forma muito significativa para estas áreas através de extensa investigação clínica e numerosas publicações, incluindo a coautoria das mais recentes definições mundiais de infeção periprotésica.
Desempenha funções ativas em diversas sociedades científicas nacionais e internacionais. Atualmente, é presidente da Sociedade Europeia de Infeção Óssea e Articular (EBJIS) e membro do Colégio de Ortopedia da Ordem dos Médicosssistente Graduado de Neurologia;
1. Em que áreas específicas da Ortopedia foca atualmente a sua prática clínica e/ou investigação?
Atualmente, a minha prática clínica e investigação estão centradas principalmente nas infeções osteoarticulares, com particular ênfase nas infeções periprotésicas. Desde cedo, comecei a dedicar-me a esta área, o que não só consolidou o meu interesse pelas complicações infeciosas no contexto de prótese, como também me levou naturalmente a expandir o foco para outras infeções osteoarticulares complexas, sobretudo as osteomielites e as infeções associadas a fraturas. Esta evolução permitiu-me desenvolver competências específicas no diagnóstico e tratamento destas patologias, que muitas vezes exigem uma abordagem diferenciada e multidisciplinar.
Paralelamente, esta experiência aprofundada nas infeções levou-me também a interessar-me pelo diagnóstico diferencial de complicações pós-operatórias, especialmente em artroplastias do joelho, e pela cirurgia de revisão protésica, áreas intimamente ligadas à minha prática diária.
2. Tendo em conta a integração no Centro Académico Clínico ICBAS/Santo António, de que forma a colaboração entre o meio académico e hospitalar tem influenciado o seu trabalho?
A integração no Centro Académico Clínico ICBAS/Santo António tem representado um contributo significativo e enriquecedor no meu percurso profissional recente. Esta ligação entre o meio académico e hospitalar tem permitido uma verdadeira articulação entre a prática clínica diária e a investigação científica.
A proximidade com o meio académico tem estimulado a participação em projetos de investigação, o contacto regular com estudantes e jovens médicos, e a constante atualização de conhecimentos. Por outro lado, a prática clínica na minha área tem proporcionado casos complexos e desafiantes que, por sua vez, alimentam o desenvolvimento de novas perguntas de investigação e a procura de soluções inovadoras.
3. O CAC aposta na inovação e na colaboração multidisciplinar. Que projetos ou iniciativas de inovação clínica tem desenvolvido ou participado recentemente?
Tenho tido a oportunidade de beneficiar do apoio do CAC em várias iniciativas que refletem bem a aposta na inovação clínica e na colaboração multidisciplinar. Destaco quatro áreas em que tenho atualmente em desenvolvimento.
- Tempo protegido para investigação clínica: Quero começar por dar os parabéns ao CAC e especificamente ao Prof. Doutor Mário Santos pela iniciativa de criação das bolsas com tempo protegido para investigação. Neste contexto, tenho tido a oportunidade de integrar no meu serviço uma médica interna apoiada por esta iniciativa, que está a desenvolver um trabalho centrado na análise do impacto clínico e económico da abordagem multidisciplinar das infeções periprotésicas no nosso centro, com foco na experiência do GRIP.
- Supervisão de projetos de doutoramento: Tenho vindo a acompanhar o desenvolvimento do doutoramento do Dr. André Carvalho, cujo projeto se dedica ao estudo das infeções relacionadas com fraturas, com forte componente clínica e relevância translacional.
- Submissão de projetos a bolsas de inovação com colaboração intra-hospitalar: Em parceria com o Serviço de Microbiologia, submetemos recentemente ao programa de bolsas internas um protocolo de investigação que propõe a utilização universal da sequenciação de nova geração (NGS) em revisões protésicas por suspeita de infeção.
- Participação em projetos externos de inovação translacional: Sou atualmente coinvestigador num projeto internacional intitulado “Lipopeptide antibiotic hydrogel formulations for treating persistent prosthetic joint infections”, que visa o desenvolvimento de hidrogéis antibióticos à base de lipopeptídeos para aplicação local em próteses infectadas.
4. A saúde digital começa a ter impacto também na Ortopedia. Como vê estas tendências e o seu impacto no futuro da especialidade?
Sem dúvida, este é um campo entusiasmante. Vejo a saúde digital com potencial para transformar a Ortopedia de forma significativa, em (pelo menos) três grandes áreas que se encontram em diferentes estágios de implementação prática.
A primeira, e atualmente mais desenvolvida, é a Telemedicina. Desde a pandemia de COVID-19, que impulsionou a adoção generalizada desta tecnologia, a consulta à distância tem-se revelado uma ferramenta poderosa na ampliação do acesso aos cuidados de saúde — particularmente útil para doentes que vivem em zonas remotas ou que enfrentam dificuldades de mobilidade. Para além da consulta remota, o crescimento de dispositivos de monitorização à distância — como os “wearables“— tem um papel cada vez mais relevante, permitindo recolher dados objetivos em tempo real sobre a mobilidade, marcha, níveis de atividade ou mesmo sinais fisiológicos, o que enriquece a avaliação clínica e personaliza o acompanhamento do doente.
A segunda área, com enorme potencial de crescimento, é a da Inteligência Artificial (IA). Neste domínio, a IA poderá assumir um papel transformador não apenas no apoio à decisão clínica, mas também no plano administrativo e logístico, aliviando a carga burocrática que recai sobre os médicos. Simultaneamente, a capacidade de processar grandes volumes de dados clínicos e identificar padrões relevantes pode ser determinante para prever riscos, orientar estratégias terapêuticas personalizadas e otimizar recursos.
A terceira vertente, ainda numa fase mais embrionária, é a da Realidade Virtual (RV) e Aumentada (RA). Estas tecnologias estão já a ser aplicadas em contextos de formação médica e planeamento cirúrgico, proporcionando simulações realistas, ambientes de treino imersivo e a possibilidade de sobrepor imagens clínicas em modelos tridimensionais do corpo humano. O seu potencial futuro é imenso, quer na educação, quer no aumento da precisão técnica em procedimentos complexos.
5. De que forma o trabalho desenvolvido no CAC tem contribuído para melhorar os cuidados prestados aos doentes ortopédicos da ULS Santo António?
Na minha perspetiva, o contributo do CAC para a melhoria dos cuidados prestados aos doentes ortopédicos da ULS Santo António não se resume à introdução de novas técnicas ou tecnologias — embora estas sejam importantes —, mas manifesta-se sobretudo na criação de um ambiente de pensamento crítico, exigência científica e partilha estruturada de conhecimento.
É evidente que saber qual a melhor opção (baseada em evidência científica) em cada caso, sobretudo nos mais difíceis, torna qualquer médico um melhor cirurgião. Mas isso não significa que todos os cirurgiões tenham de ser cientistas. Essa é uma ideia cada vez mais difundida — a de que o bom cirurgião tem de acumular também um perfil de investigador ativo — e, embora compreensível, considero-a em parte falaciosa. No limite, o essencial continua a ser saber operar bem, tomar boas decisões intraoperatórias e, com isso, tratar eficazmente os doentes.
No entanto, também acredito que alguém tem de investigar, produzir conhecimento e, acima de tudo, transformar esse conhecimento em prática clínica, através da formação contínua, da criação de “guidelines” e da promoção de boas práticas baseadas em evidência. E é precisamente aí que vejo o papel mais decisivo do CAC — enquanto estruturador e facilitador dessa ponte entre a ciência e a clínica.
O apoio a projetos de investigação, a criação de condições para o desenvolvimento académico dos clínicos, e o estímulo à produção e partilha de conhecimento têm permitido que ideias inovadoras se transformem em modelos organizativos mais eficientes, abordagens terapêuticas mais adequadas e cuidados mais seguros e eficazes para os nossos doentes. Nesse sentido, o trabalho desenvolvido no CAC não melhora apenas a formação dos profissionais; melhora, acima de tudo, a qualidade dos cuidados que prestamos todos os dias.
6. Que papel têm as novas tecnologias na sua prática clínica e que futuro antevê para estas ferramentas na Ortopedia?
Na minha prática clínica, destaco particularmente a inteligência artificial (IA), que já se encontra institucionalizada no meu consultório, sobretudo como apoio administrativo e logístico. Utilizo regularmente sistemas inteligentes para otimizar a gestão de agendas, organização de documentos clínicos e comunicação com os doentes, o que se traduz numa prática mais eficiente e focada no essencial: o cuidado ao doente.
Para além da vertente assistencial, a IA tem também um papel fundamental na minha atividade científica. Utilizo frequentemente estas ferramentas para:
- Apoio à redação e estruturação de documentos científicos (como propostas de projeto, capítulos de livro ou apresentações);
- Resumos críticos de artigos e revisão de literatura, facilitando a identificação rápida de informação relevante e atualizada;
- Extração e organização de dados para revisões sistemáticas e meta-análises, permitindo maior precisão, rapidez e rastreabilidade dos processos.
Acredito que o grande desafio será garantir que estas ferramentas se desenvolvam de forma ética, validada e centrada no benefício clínico, mantendo o foco na relação médico-doente e na qualidade dos cuidados prestados.
Desenvolvido por: Gabinete de Comunicação e Imagem ICBAS e Direção de Marketing e Comunicação Santo António