Pessoa CAC ICBAS-Santo António | abril 2025


BI

Nome: Luís Maia | Médico Neurologista na ULS de Santo António  | Docente do iCBAS | 

Responsável pelo Biobanco CAC ICBAS-Santo António

Formação:
 Licenciatura em Medicina pelo ICBAS;
Doutoramento pela Universidade de Tuebingen, Alemanha

Resumo: Assistente Graduado de Neurologia;
Professor Associado Convidado ICBAS;
Investigador no I3S;
Responsável pelo Biobanco CAC ICBAS-Santo António

Máxima Clínica: Ajudar o doente e promover a investigação científica

1. O que é o Biobanco e qual a sua importância para a investigação em medicina?

Um biobanco é uma estrutura que preserva amostras biológicas associada a informação clínica estruturada recolhida de forma sistemática.  É, por isso, muito mais que um repositório de amostras. Cada amostra tem associada uma série de informação clínica robusta e organizada, que pode incluir os antecedentes do doente e a situação clínica no momento da colheita, exames de imagem, inquéritos e escalas. Desta forma, acrescentamos valor face a uma amostra isolada, e isso permite-nos elaborar e responder a uma série de perguntas no âmbito de projetos de investigação clínica ou básica.

Enquanto investigador tenho interesse na área das neurociências de translação, e recorro a amostras biológicas para responder a perguntas clinicamente relevantes – no caso do meu trabalho, ligado a biomarcadores de diagnóstico e prognóstico de AVC, uma doença muito incapacitante e de elevada incidência no nosso país. Em articulação com vários serviços e profissionais hospitalares, estabelecemos coortes de doentes com registos clínicos prospetivos e colheitas de sangue longitudinais, em momentos chave no percurso dos doentes na sua jornada hospitalar. Ao integrarem um biobanco, essas amostras alargam ainda mais a sua utilidade podendo responder a perguntas de mais investigadores.
Por isso, o nosso objetivo com o Biobanco CAC ICBAS-Santo António passa por desenvolver uma infraestrutura, com utilidade para a investigação, apoiada na atividade clínica que é desenvolvida no hospital. Em particular, focar-nos-emos no âmbito dos diferentes centros de referência nacional e internacional, em que o hospital se tem procurado diferenciar. Pretendemos construir uma série de coleções de amostras aliadas a um processamento de informação muito rigoroso, que pode ser útil tanto para investigação clínica como para a investigação mais básica, servindo as instituições associadas ao Biobanco e apoiando colaborações externas.


2. Em que ponto está a criação do Biobanco CAC ICBAS-Santo António?

Estamos a começar. Fruto da qualidade do trabalho clínico e científico desenvolvido na ULSSA, existem vários já repositórios de amostras no hospital, alguns prevendo uma possível integração em biobancos formais. Para contruir o Biobanco CAC-ICBAS vai necessário assegurar que há informação clínica suficiente e organizada e que a qualidade das amostras foi garantida ao longo do processo de armazenamento. É nisso que estamos a trabalhar. Progressivamente, iremos também promover o estabelecimento de novas coleções, envolvendo o máximo de áreas hospitalares e os profissionais interessados das instituições associadas ao CAC.


3. O que torna este biobanco distintivo? 

O Biobanco será em grande medida o espelho da qualidade do trabalho clínico desenvolvido no hospital, que é altamente especializado. Poderá ter algumas particularidades únicas como, por exemplo, na área das neurociências temos prevista uma associação com o Banco Português de Cérebros coordenado pelo Ricardo Taipa. Os doentes inscritos em cada um dos biobancos serão convidados a participar no outro. Esta combinação trará  algo único na medida em que teremos a possibilidade de acompanhar e registar os eventos relevantes ao longo da vida do doente e, no final, ter o diagnóstico definitivo (que pode coincidir, ou não, com o diagnóstico formulado pelos clínicos). Ou seja, além de termos uma fotografia final, teremos todo um filme, um caminho de informação associada ao longo da vida do doente. Isto será um recurso de valor muito elevado para estudos de investigação clínica, farmacêutica, ensaios clínicos, parcerias com universidades e participação em consórcios internacionais.


4. Como funciona a integração dos doentes neste biobanco? É algo compreendido facilmente?

A participação dos doentes é sempre voluntária. Existem alguns projetos de investigação que incluem a recolha e materiais biológicos e, a minha experiência com doentes e familiares, tem sido muito positiva. Na sua grande maioria, os doentes são muito recetivos em participar em estudos de investigação, mesmo sabendo que aquele trabalho pode não ter impacto na sua condição, mas antes um impacto a longo prazo, que poderá beneficiar outros doentes no futuro. Nós procuramos sempre minorar o desconforto, ser o menos invasivos possível, quer em termos de “intrusão” no corpo, quer em termos de organização da vida pessoal. Por isso a colheita de informação e amostras biológicas será programada no âmbito do seguimento clínico habitual, evitando duplicação de colheitas e/ou de deslocações ao hospital.


5. A relação academia/hospital como se tem vindo a estabelecer? Da sua perspetiva qual deve ser o caminho para incentivar a investigação?

Um dos aspetos benéficos foi a transformação da licenciatura em mestrado integrado em medicina. As teses de mestrado podem ser muito interessantes para o estudante de medicina contactar com a investigação científica. Há alguns bons exemplos de alunos desta casa em que o bom trabalho na tese ajudou a desenvolver um trajeto de médico-investigador.  Para além disso, a reformulação curricular na UC Dissertação/Projeto/Estágio do MIM permitiu que o projeto se possa iniciar mais precocemente no curso, e isso é muito vantajoso. Principalmente porque os estudantes contactam mais cedo com a investigação, o que permite que alguns projetos, tanto os básicos como os clínicos, se desenvolvam com o tempo necessário para um trabalho de investigação estruturado, sólido e com impacto clínico e científico.

No entanto, na minha perspetiva, um dos, ou talvez o principal fator limitante para incentivar a investigação, é a pouca valorização da atividade de investigação na carreira do médico e, provavelmente, na dos outros profissionais de saúde. Frequentemente, os médicos que se dedicam à investigação fazem-no sobretudo por um desígnio pessoal, podendo até sair em prejuízo da carreia médica. Ter sucesso enquanto investigador é difícil, a competição é internacional e, no entanto, tem muito pouca relevância na atual carreira médica. É uma reforma precisa de ser feita. Isto é particularmente relevante para que os estudantes de medicina considerem esta via como uma hipótese de carreira na área clínica, e não apenas como um momento de escrever uma tese, ou um artigo. Evidentemente que isto não depende de uma escola médica nem de um hospital, mas será estratégico implementar esta possibilidade. A realidade internacional mostra que as intuições clínicas universitárias onde há mais sucesso em termos de avanço da medicina são aquelas onde a investigação é mais proeminente, seja a investigação clínica, seja a investigação de translação ou mais fundamental.


 

Desenvolvido por: Gabinete de Comunicação e Imagem ICBAS e Direção de Marketing e Comunicação Santo António

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